domingo, março 04, 2007

Banda Grossa

Há alguns meses, o mercado de quadrinhos nacionais foi abalado pela polêmica da revista Banda Grossa. O gibi foi financiado pela Fundação Cultural de Joinville, presidida pelo secretário Rodrigo Bornholdt. Após a sua publicação, alguns vereadores reclamaram com o que chamaram de “apologia a drogas” e outros problemas e exigiram o retorno do financiamento. Bornholdt se defende: alega que os editores inscreveram um projeto e concluíram outro enquanto Paulo Gerloff, editor da revista, afirma que, em momento algum, o edital exigia que se descrevesse o projeto, mas apenas se mencionasse trabalhos anteriores.

Não é de hoje que autores de quadrinhos passam por problemas com financiamentos públicos. No início dos anos 90, a revista Dum-Dum, patrocinada pela prefeitura de Porto Alegre, causou a mesma polêmica na oposição que a acusava de pornografia. A revista foi criada por um certo Adão Iturrusgari, criador da personagem Aline.


Insisto em afirmar que a análise dos méritos do conteúdo apresentado na revista Banda Grossa, tanto no projeto inicial quanto no resultado final, é da comissão julgadora. Entretanto, um aspecto curioso a ressaltar é que, aparentemente, o primeiro juízo de valor nesse sentido partiu dos próprios editores da revista, ao divulgar, através de release, em março deste ano, que o lançamento "marca o investimento de verbas públicas - logo, dinheiro do contribuinte - na difusão de idéias relacionadas à iconolastria, ao onanismo, ao sexo por tesão (incluindo zoofilia e necrofilia), ao meretrício, ao consumo de álcool, cigarros e outras drogas menos perigosas". Assim, imagino que os próprios editores poderiam apontar na revista as tais idéias que divulgaram”, afirmou o secretário da Fundação Cultural, em entrevista ao SoBReCaRga.

Bornholdt nega a palavra “censura”. Segundo o secretário, a Fundação Cultural jamais impediu a circulação ou distribuição da revista. “A questão aqui é outra: a comissão que avaliou e aprovou o projeto afirma que o mesmo não foi cumprido. E o que se prevê nesse caso, no contrato assinado entre as partes, é a devolução dos recursos”, defende.

O que ocorreu foi um equivoco da Câmara de Vereadores, que não está apta à discussões abertas sobre arte. Até então (em cerca de 3 meses), como já mencionei, eu não sabia da rejeição da Fundação Cultural com a revista, se é que existiu isso, tanto que visitei diversas vezes a instituição e nunca me falaram nada, declara Paulo Gerloff, editor da Banda Grossa.

O desmentido não acaba aí. Segundo Gerloff, meia dúzia de exemplares foram entregues à Fundação Cultural antes de seu lançamento, em 31 de março deste ano. “A edição não surtiu nenhum efeito negativo onde a instituição se defende contra os vereadores dizendo que o projeto aprovado não tem nada a ver com publicado”, declara. Gerloff lembra ainda que o projeto previa “uma revista de humor nos moldes da Chiclete com Banana e Animal”.

Para Bornholdt, entretanto os responsáveis pela revista erraram. O secretário lembra que a opinião de que os artistas não obedeceram ao projeto original vem dos membros da comissão que o aprovaram, de forma unânime:

A revista Banda Grossa foi beneficiada no Edital de Apoio às Artes, na categoria de Artes Plásticas - Projeto Coletivo. Nessa modalidade, o edital não solicita obras executadas, já que a maioria das propostas é para execução de projetos inéditos. Uma comissão especialmente convidada, formada por especialistas, analisa a descrição da proposta. Os trabalhos anteriores - e não necessariamente os que serão expostos ou publicados - servem de base para a análise estética, explica.

Entre as medidas judiciais da Fundação Cultural está a exigência da devolução dos recursos aplicados e a retirada das logomarcas da prefeitura e do órgão. “A lição que fica é que mais do que uma prestação de contas financeira, a comissão que aprovou o projeto também deve analisar a execução tecnicamente”, frisa Bornholdt que também complementa afirmando que o novo controle não significa nenhuma perda da liberdade de expressão.

Gerloff não demonstra preocupação. O artista defende a pertinência do seu projeto alegando que não havia nenhum capital para realizá-lo. “Estamos planejando a segunda edição, capitaneada pela venda da primeira, que está vendendo bem por causa dessa polêmica. Acho até que o próximo passo é fundar uma igreja, arrebatar uma centena de fiéis e viver de dízimo”, afirma.

(*) Publicada originalmente no Sobrecarga.